frente a frente, ao espelho,
olho-me, vejo-me…
fixo-me no meu próprio olhar,
tentando desvendar-lhe algum segredo,
procurando dúvidas, remexendo incertezas…
apreciando as minhas imperfeições,
contemplando, algumas, perfeitas emoções…
por algum tempo,
somos dois olhares que se cruzam,
tentando focar o mais e menos infinito.
no momento em que se cruzam…
sinto quebrar as barreiras…
sei não estar sozinho…
porque no meu olhar,
são invisíveis as fronteiras!?
porque no meu olhar,
há casas,
há janelas deformadas pelo tempo.
como meus olhos um pouco envelhecidos,
por muitos olhares amargurados
por muitos dias enraivecidos … à janela.
porque no meu olhar,
há chuva, há vento,
há pássaros e brisas de gente… pousados!
há videiras… amieiros embriagados
há sobretudo a imagem simples de um ser complexo
há um volúvel ribeiro…
há um enorme universo!
quem dera poder ler o pensamento deste reflexo
quem dera tocá-lo e sentir-lhe calor
quem dera
poder devolver-me…
devolver-lhe a sua imagem
e conseguir entendê-la num breve sorriso!
que química provocará este arrepio intenso?
são as brisas que anunciam o vento
que vem de dentro...
gostaria de ser igualmente forte, capaz…
mas o meu bailado é solitário
o palco é um espaço interior onde dançam
meus pensamentos
onde surgem as palavras que acompanham meu acto
onde de facto vou representando a vida
que me consome lentamente
onde apenas e tudo será diferente...
se poder provar a luz do teu sorriso
se nos teus braços encontrar o paraíso que procuro
se amor for, antes da morte, porto seguro
onde ancore os meus abraços…
que navegar pelo teu mar
sejam meus passos: o caminhar preciso
para ser feliz…
que a ausência do que sempre quis
renove a poesia onde nos damos
que no lugar onde nos amamos
seja sempre Primavera!!!
o meu sentido pesar pelo falecimento
de um pensador admirável...
breve é o nosso acto de pensar eterno
efémeros que vamos, nós, a favor do tempo...
cala-se a voz um eco que persiste
na vida de quem sobe ou desce essa colina
deixem-nos sucumbir de pensamento em riste
que é arma e alimento a fome que o determina…
a minha reverência a:
António Azevedo (ágora Aistésis)
imagem: kyle thompson
regressarei, talvez, mais intensamente
a esse lugar de luz que me fascina...
procuras revelar segredos
em meu corpo diáfano
prazeres que não cessam
possuído que estou por todo o teu desejo
quero ser fêmea e afogar teu beijo
num doce entardecer
em minha boca ardente
quero amar-te para sempre
e t e r n a m e n t e !
então sê silêncio
pois que o que necessito agora é de silêncio
uma mão que me segure esta raiva em erupção
uma canção de embalar que serenize a minha dor
que amenize esta tempestade que se abate sobre mim
neste antecipar do amor seu próprio fim
imagem: © Odilon Redon