não há mar
que chegue à tua imensitude
não há no céu estrela
que tenha o brilho teu
não há no mundo
amor como esse que só meu
maior que qualquer astro ou planeta
não há capaz palavra nem poeta
que possa descrever
um amor meu!
Novembro
Outono adentro
estação onde espero
o regresso florido da
Primavera onde me ausento
imagem: Daniela Treymann
Resposta dialéctica à poética de João Ramos
por Luís Nóbrega
Não é por haver ramos, e até muitos, que se poderá podar às cegas.
Ainda hoje falávamos das varas, das hastes, dos rebentos descobridores que são como antenas sensíveis da terra-mãe. Enfim; eu dizia, com a minha pseudo-incongruência rural que às vezes passa por conhecimento vegetal, intuitivo, é claro, dizia então que se devem cortar os torcidos, os meleados e os ladrões, (e depois falo contra os ditadores), mas mesmo que se cortem nos trâmites da arte e atendendo à especificidade cástica das cepas centenares parece que nada resiste à “cáustica genética” trespassando a constancidade do “pesadelo”. O teu, e o nosso também quando no-lo mostras.
Consciente de uma memória quase esmagadora, feita de vácuo peso irrespirável, já quase desistente de “acordar corações” mas que ainda ilumina azuis esfomeados de gente de olhos, de olhos em frente.
Em frente, a urgência parece ser cada vez mais quando... quando se corre, se grita, se procura uma vitória colorida, e se luta rodeado de repressão colectiva, electiva, contra a pose espampanante da vaidade, aqui a «certeza» torna-se viagem vã e estéril, “cada vez mais” inicias “Latitudes”, com longitudes e marcas rotas num mapa astral onde a viagem, a tua, leva ao sono dos cansaços com sorrisos que se ouvem.
Ouviste então a gente que não foge de ser só gente e olha de frente a criança que ainda não soube ser.
“então”; “frente a frente” remexendo, remoendo labirintos de caminhos cruzados em momentos quase parados porque “há janelas deformadas pelo tempo” no renovar da imagem o espelho vibra convexo, desconexo de desistências, complexo de vontades e é precisa toda a coragem para chegar até ao sorriso.
Ah! Também comes, bebes, e dormes e o mais que é preciso para ter uma utopia. São os ramos meleados de, sei lá, um dia, dois, de toda uma primavera, que só sonhavam em ter algumas folhas encostadas à telha antiga. Uma utopia de frescura mineral.
São viagens tais como as das “mãos impossíveis” que te acompanham as sedes, as fomes, em tudo em volta, o que gira, o que há, o que achas longe, o que com a “débil palavra” gritas, gritas.
Talvez para “nunca sentir o Inverno”.
No entanto, num movimento infinitamente mineral encontras harmonias. Porque pressentes ausentes de rostos marcados, paralíticos da alma, tão impenetráveis e duros que achaste melhor e mais alto ir “escrever pedra”.
Que “situação”!?
Novamente insistes no azul. Na tepidez da ternura feminina; depois serena; depois cálida; ternura húmida, tens razão: o húmus é tudo, é terra palpitante, é fonte de todos os sabores, de todos os cheiros, dos únicos gestos verdadeiros, é, acima de tudo, a própria vida (com vida própria), esperança que importa repetir. Insistamos na esperança.
(em resposta caquéctica à arte poética do Ramos, ripostamos: - “os homens “ não “estão desertos”, estão sozinhos em espaços terrivelmente abertos e têm medo de soltarem gritos certos.)
As “gentes pequenas” podem ter as montanhas que lhes dás, que lhes inventas, que sonhas e contas, que fotografas do cimo das nuvens mensageiras, com as quais passas com as tuas “asas verdadeiras” e então entregas à gente “montanhas inteiras”.
(Poeta não serás? Então que dirás?)
Que dirás quando as palavras não tiveram dedos, nem mãos, nem braços, nem língua, nem pernas, nem narizes, nem pestanas carregadas de letras e mais letras repetidas, renovadas, redimidas, reparadas e ás vezes paradas mas
Poeta serás sempre em qualquer dia enquanto houver um gesto que te “invada poesia”.
Só é quem se permite ser, por entre incertezas, verdades amargas, ilusões, solidões, sensações, decepções, alegrões, chorões, (lá estou eu com a mania dos rimões), não, não e não, afinal, mas sem final, só sente quem se consente sentir. O tempo que diga o resto.
Que é isso de te expropriarem um silêncio?
Por mais águas que passem e que os lugares mudem jamais conseguirão amputar-te os regressos.
(É uma frustração não saber falar de amizade, vou andando, se podendo vou-me podando.)
Os amigos deveriam ser como as árvores, crescem, morrem ou definham à sombra de um qualquer muro que a vida lhes pôs ali, também se transformam, mas, renascendo, em cada primavera volta, intacta, a memória de cada nervura de cada folha, de cada verde, do mesmo verde, da mesma dança com o vento, do mesmo fruto com o mesmo sabor
ouso buscar poesia
na compartimentação dos quartos
das sedas a arquitectura
concêntrica e exacta do poema
onde dorme o silêncio
onde flui insinuante o
pensamento agitado da insónia
onde apenas e só
as paredes verticais alinham
nas arestas
horizontes próximos e possíveis
do levitar primordial da cama
transcende-se o que resta dessa
alma incerta que busca
uma outra mais concreta e
sublime
toda Tu
imensa És
tão grande Poetisa
do nada
teu verso amor
se eterniza
rio de onde havemos
hoje renascido…
se a minha voz for
brisa que agora sintas
sussurrando ao ouvido…
a minha mão sentires, quente,
instigando o verso
serei…
tentando apenas
compreender a dimensão desse
universo que encontrei
em tua poesia
quero-me exangue!
extinto o fogo e
a água que somos
no coração da terra
quero olhar contigo a maresia
e renascer no amor
que ainda se espera!
imagem: Jeannie McGuire
Por vezes, tenho quedas ascensões e depressões…
Pela rudeza das palavras que me surgem… a dor da expiração é por vezes irrespirável...
“Existe a falta/ Existe a falha/ Esta ausência humana/ Que me calha/ Que cai em mim/ Saudade grande/ A queda alta/ Funda/ Que me invade/ E acerta/ E faz de mim/ Um ser exangue/ Que do sonho não desperta .../ / Por ser só vício.../ Sinto agora que escrevo/ Pra fugir do precipício.”
“A depressão é um estado sazonal por onde vou vivendo alguns momentos de grande sensibilidade: Uma metamorfose temporária que me possibilita, por vezes, um percurso de contraditória felicidade; Uma ascensão em vez da decadência; Uma procura em vez da desistência e da falência que lhe são comuns....
Mantenho, assim, o que se poderá chamar, uma relação saudável ou pelo menos de algum equilíbrio com essa "maldição" que se mostra, quase sempre, altamente corrosiva para tanta gente...”
“Nem tudo é mau na depressão… quando o regresso é possível sem grandes lesões internas…”
A escolaridade insuficiente limita-me. Mas ainda mais o hermetismo a que me remeto.
Sem avisar, a escrita surgiu, por paixão a 1 de Novembro 1998 .
Já pensei fazer uma edição de autor, mas tenho tido muita dificuldade em seleccionar e organizar…“Pensei vender poesia a retalho para não ter o trabalho de construir um livro” (como alternativa vou partilhando...)
“As minhas palavras não são nada!/ Nada trarão, de novo, à humanidade/ Reflexos do olhar na mão cansada/ Não são senão de mim pura vaidade./ / A vida não me deu sexto sentido/ Nem largos horizontes de verdade/ Mostrou-me a força de dizer e ser ouvido / nos sons da poesia que me invade. / / Antes dizer o quanto pesam/ Momentos solitários que enternecem/ Memórias de um presente que foi meu / / Réstias de dor, amor e de saudade/ Mostrando ao largo toda a eternidade/ Aquilo que é o outro e que sou eu”
aceito-te tal com és…
da forma como te dás
a mim… inteira!!!
teu olhar bastaria.
meu sonho merecido
é bem menos que tudo isso
que me ofereces
quero-te!!!
coração, abraço e beijo
esse rio crescendo de desejo
desaguando amor
na mesma sílaba
ofereço-me, a ti,
para que me veles
quero teu ombro:
meu tempo
de sonhar
tuas mãos
tão generosas!
Vivo ainda uma inocência e uma infantilidade prolongadas pela lentidão do amadurecimento …
Nem mesmo nesta minha “idade do Outono” se apaga o que resta dessa criança eterna. Que a seguir recordo no essencial do texto “Costa do Pombo”:“Sr.ª de Lourdes a rampa subida/ O seu cheiro a mimosa, mimosa florida/ E ao chegar ao cimo/ o suor de verão/ Calção curto vestido/ e pé descalço no chão/ / Com o meu carrinho caminho à partida/ de corda na mão e alcatrão no rosto/ a brisa na descida/ até ao sol-posto/ / Sr.ª de Lourdes mimosa florida/ Ficou para trás na rampa vencida/ /A menina Olga e sua irmã Emília/ Os muitos amigos e a minha família/ E para aprender as letras da vida/ nas orelhas a cana a cana comprida/ As contas de ponteiro e cuspo na lousa/ Cantando: “seca seca marinheiro/Que o teu pai dá-te dinheiro...”/ / Enquanto ao lado um outeiro/ Em mim pousa/ E um ouriço caindo/ Faz uma mossa no chão/ Num manto de folhas sentindo/ Um gesto de solidão”
A minha estação de referência é o Outono…“é no Outono que a natureza se despe…/ Sem preconceitos”…
A flor que mais gosto?… Não sei, sequer, ainda, o seu nome. Sei da sua florida persistência ao longo de todo o ano… e é isso que me encanta!
Gosto de me sentir apaixonado, enamorado… Porque “É numa ternura de olhares.../ Que perfeito o meu olhar se vê / É no beijo quente feminino/ Que me sonho eternamente ... Pequenino!”
Tenho um interior bucólico com odores campestres activos… mas, infelizmente, vou tendo que sobreviver, diariamente, à acidez urbano-depressiva. “ Buscam felicidades algures no progresso…. E eu à procura de um regresso à cidade que perdi.” “ a cidade é bem mais calma vista a esta distância”
Vivo, em comunidade, a marginalidade do ermita… na minha escrita…“… a incomunidade possível comunicabilidade artesanal de um leigo, quase analfabeto que sente a pressão incomedida dos limites, do tempo que quase não resta. A falta de abertura nos horizontes cada vez mais sem sorriso. Ausência quase esquecida! Ou quase lembrada… fronteiras da minha terra onde eu não sou nada!”
Para suportar a “caustica genética” deste “pesadelo constante” …
É muitas vezes ao húmus que vou buscar a verticalidade das grandes árvores e a paciente atitude perante a agressividade do tempo numa postura guerreira contra todas as intempéries.
“Tudo em nós é terra.. Tudo vibra ao vigor dessa emoção geológica persistente. Tudo é mar e um pouco do seu sal…Tudo arde em nós de extrema incandescência” tudo é fogo e alma e chama “O que mereço… é só loucura/ É só alucinação cósmica :… a cor irreal/ Da insanidade latejante de um pensamento / Frio no infinito padecer da alma/ No vórtice desse outro inferno que nos aclama/ Matéria para combustão e sofrimento”
“Não são azuis/ os corações que sonho./ / O ódio podre neles contido/ ferve a cáustica genética/ vazando a hereditariedade de gerações/ mantidas em pesadelo constante./ / Neste pesadelo meu.../ não são corações/ os azuis que tenho/ com urgência/ de acordar...”
Gosto do oceano. Mas o meu mar é de montanhas… O rio hidrata esse percurso que me leva nessa “errância”… Sou um ser à deriva na vida que passa depressa pela lentidão dos meus dias: “sonhei ser artista/ a inércia não me deixou/ definho no letargo que sou/ porque a vontade é demais/ e não consigo contrariar/ o desespero em que me encontro.// a minha cabeça confusa,… pesada/ a guerra que não vou vencer…/eu próprio!”
Gostaria de ter sido cantor, actor… mas admiro muito o Pastor. Esse ser “solitário”.
“ onde estará essa porta que não encontro? por onde andará perdido o meu rebanho?”
“vou-me por emanações como gado bravio(…)movimento perpétuo das minhas raízes… minha extrema fixação à terra… minha mãe… meu lugar de sempre!” “ vou no desespero gasto do silêncio/ aguardando a chegada da ternura!/ e porque o frio espacial gela!.../ / vou lançando à terra os astros/ que fertilizam a minha/ árida semeadura…”
"
A situação levou-me a sair de latitudes mais baixas e a procurar abrigo em latitudes menos poluídas de gente que não é..." escrevi um dia.
Incomodam-me as pessoas que agem como se fossem “maiores”. Há quem diga que é complexo de inferioridade. Há quem diga que é de superior arrogância. Mas não!... É sim um complexo de igualdade … Mais uma dessas patologias raras de que dificilmente me libertarei.
“Jamais serei ao pé de alguém verdade viva se não estiver entre outros à mesma altura”
“Quando para falares com uma criança conseguires ajoelhar-te e olhá-la de frente… Quando souberes ser Gente!...” É nesta postura de olhares horizontais que eu me revejo e vejo a sua perpendicularidade... É nesta humilde condição de utopicamente nos ver todos ao nosso melhor nível que eu habito um mundo desejado e desejável... Uma irrealidade concretizada apenas nas minhas viagens à minha geografia interior.
“as imagens possíveis.../ neste lugar ao sul no meu/ interior nordeste/ uma viagem à minha / geografia interior/ lugar onde sou e que sou, sempre!.../ ainda que em Latitudes ausentes/ buscando uma longitude constante”
poderei chamar-te meu amor?
que assim me toca essa distância…
regresso inebriado a essa flor
como borboleta que procura sua fragrância…
ondulante flutuação um mar imenso
de onde embarcado surjo
navegador de mares desconhecidos
ignorando tempestades ventos perdidos
derivando com exactidão na linha incerta
um novo horizonte que me prende e que
se estende em colisão com a minha rota…
imagem: © Adam Wawrzyniak
não importa
por quanto e o que esse tempo
nos possa conceder
vivamos com intensidade
este amanhecer
sem anteciparmos culpas
pelo que de nós… possa levar
vivamos como se frágeis nos
pudéssemos quebrar
à ausência desse encantamento…
vivo! como se frágil me pudesse
quebrar à ausência da tua floração
certo de que irá
permanecer doce essa brisa
em nosso pensamento
por muitas mais
polinizações
imagem: © Aria Baró
A ideia surge para que a agarres com obsessão. Surge como qualquer sincronia cósmica: um sopro num dente-de-leão… Impulso neurológico não rejeitado pela mão obediente que lhe prolonga uma visível e tímida ambição… Aragens de liberdade e de conquistas simples. Lugares cativos para todas as palavras que convergiram e não couberam noutros lugares… (não encontraram outros amores) nesses espaços mortos de ausência extrema e infinita… noutros buracos; noutras falhas; noutros vazios… noutras viagens (desa)rumadas… ou exactas, nos trilhos alinhadinhos dos comboios. Na rebelde adrenalina das rotas oceânicas… nas migrações de liberdade dos navios.
Mário João
…
acredito
na solidez do que nos une
na transparência do que nos separa
por isso te vejo com tanta nitidez
a sensatez de um olhar maduro
que apenas descreve
a exactidão do traço
a profusão da cor
o inebriante intenso dos aromas
a perfeição da volumetria das pétalas
a suavidade do umbigo
que me liga ao teu interior
e o sol...
que há lá dentro!...
.
.
imagem: Jack Spencer
not bad as it seams
not always fully happy
not always tenderly dreams
my strength follows the wickness of the breath
the sadness of the day agreed
and the words, hopeless, stays above
of the love that you need
na incerteza da tua boca...
no monólogo da minha solidão etérea... procuro-te!!!
voz sublime que me possa resgatar
"Deito [me] em todos os [teus] dialectos no
instante exato em que o silêncio se impõe e
aconchego [me] preguiçosamente no sublinhar
preciso dos teus versos."
By Lampejos
quem poderá resistir aos teus encantos e
ao ímpeto ligante e atraente das tuas palavras
sem o reflectir com ternura… com paixão?
vivo também apaixonado pela poesia que te é intrínseca
por essa que és acima de meus versos aconchego
lugar onde sonho permanecer
saboreando lentamente a seiva do teu doce e
inesperado acolhimento…
deixo-me envolver pela modulação de tuas carícias
até à exaustão do tempo
num singular envolvimento espiritual
... quero sublimar essa exacta geometria
ao etéreo da tua sensualidade feminina afluir
num deslumbre acima da razão
como quem te vê e sente
Flor de Outono!
imagem: Anna O.
assinalo o nono aniversário das “palavras que eu vivi”
e que vou vivendo… à procura de me poder colher
ainda mais maduro
envelheço! esperando, à beira rio, que
chegues na corrente ainda a tempo
de me amar…
Flor de Outono! viva a sua cor
de Primavera
borboleta branca que encanta o
meu tempo de espera.
imagem: Anna O.